Mineração é nosso destino

18/02/2014- Entrevista publicada na edição 253 da Revista DeFato O renomado professor e ex-ministro Paulo de Tarso de Almeida Paiva diz que não é possível falar de Minas Gerais sem considerar a mineração. “Não é escolha, é destino”, afirma. Em visita a Itabira a convite da Vale, Paiva concedeu entrevista a DeFato após uma roda de conversa com membros da imprensa local para falar sobre mineração e suas consequências – positivas e negativas. Paiva é mestre em Demografia pela University of Pensylvania, professor da Fundação Dom Cabral, ex-presidente do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), ex-secretário de Transportes e Obras Públicas do Estado de Minas, vice-presidente de Planejamento e Administração do BID e ex-ministro de Planejamento, Orçamento e do Trabalho no Governo Itamar Franco. Sua visão sobre a atividade mineradora é bastante otimista – e também ponderada. Mineração, segundo ele, sempre estará rodeada de polêmicas: de um lado estão os que defendem o setor como um trampolim (locomotiva, máquina) para o desenvolvimento; de outro os que consideram a atividade um atraso para a sociedade (degradação, entrave). A visão realista, na opinião do ex-ministro, é de que a mineração pode trazer oportunidades e fazer avançar o desenvolvimento, apesar dos vários desafios. Em Minas Gerais, a atividade é o pilar do crescimento e a mola mestra das exportações. Itabira, Nova Lima e São Gonçalo do Rio Abaixo são algumas cidades que pesam positivamente a balança comercial do país. A seguir, Paulo fala das tecnologias que o setor tem incorporado à extração mineral, da relação das empresas com as cidades que crescem em torno delas e sobre a economia do Brasil de maneira geral. O senhor afirma que a mineração é nosso destino. Como avalia o valor agregado às nossas commodities? E a nossa indústria da transformação? Acho que mineração e indústria não são excludentes. O mundo está globalizado, cada vez mais integrado. Há uma demanda por recursos naturais. O Brasil tem esses recursos, seja na área da mineração ou no agronegócio. O país não pode perder esse mercado, porque isso gera riqueza. A integração do mercado externo garante também para o Brasil a incorporação de novas tecnologias. A indústria de transformação é uma consequência disso. Até o ano de 2030 vamos incorporar à população brasileira mais 20 milhões de pessoas. É como se trouxéssemos uma Minas Gerais para dentro do Brasil. Dessas 20 milhões, 16 milhões estarão dentro do mercado de consumo, entre as classes C, A e B. É uma grande oportunidade que se abre para a indústria da transformação em nosso país, que precisa aumentar a produção de bens e serviços que, de um lado gera emprego, do outro oferece produtos para esse consumo. Enfim, acho que a venda de commodities e o crescimento da indústria de transformação são complementares. No caso das cidades mineradoras, elas são muito dependentes da atividade extrativista. O que fazer para melhorar? Acho que em alguns casos há possibilidade de se agregar outras atividades. Imaginar que você vai colocar uma siderurgia ao lado de cada mineradora é uma ilusão. Não é possível até pela escala dessas atividades. Acho que aí cada cidade deve encontrar suas potencialidades e oportunidades. Eventualmente ao lado de uma mineradora você pode ter uma atividade comercial importante, de serviços, de educação, saúde, ou mesmo a indústria de transformação. Acho que se deve aproveitar enquanto a mineração está no boom para desenvolver outros tipos de atividade. Por que há sempre essa relação de conflito entre as mineradoras e as comunidades? Não conheço nada, por exemplo, da relação da Vale com essa região. Mas temos, tanto na área da mineração, mas principalmente na da siderurgia, cidades que foram criadas com base nessas empresas. Ipatinga, no Vale do Aço, é um exemplo disso. Volta Redonda (RJ) é outro exemplo. São cidades que cresceram em torno de grandes empresas e, por isso, se cria aí uma relação de amor e ódio. Temos no nosso país também uma tendência de achar que a empresa tem, assim como o governo, obrigação de transferir benefícios. Acho que a palavra é parceria. Tem de se construir parcerias porque empresa, para sobreviver, tem de buscar sua lucratividade. Ela depende da sociedade e a sociedade depende da empresa. É preciso construir parcerias entre empresas, sociedade e governo para que todos tenham mais qualidade de vida. O governo brasileiro tem apostado no estímulo ao consumo para manter o crescimento da economia. O senhor concorda? No caso da economia brasileira, você tem um conflito, uma coisa que é preciso qualificar. De um lado, de fato, é importante o crescimento, incluir as pessoas, e isso o Brasil tem feito com muita competência. Não é nem uma coisa recente. A origem disso é a estabilidade econômica, a queda da inflação, as reformas econômicas e, em consequência disso, o crescimento permitiu que fosse incorporada uma classe de consumo no Brasil. De 2003 para cá, essa classe representa mais de 60 milhões de pessoas. Isso é um ganho muito grande da sociedade brasileira. Do ponto de vista da economia, para você manter, é importante que se crie condições para aumentar a oferta de bens e serviços que a população possa consumir. Para isso é necessário investimento. E aí é onde o governo tem falhado. Em 2008, em função da crise, se estimulou algumas medidas de aumento de consumo para manter a economia crescendo. Naquele momento foi importante, mas hoje essas medidas não estão tendo o mesmo impacto. É necessário que se tenha um investimento, principalmente em infraestrutura, tanto investimento público quanto privado. A infraestrutura, principalmente na área de transporte e logística, necessita muito de investimentos privados. O governo começou a fazer algum esforço de concessão de rodovias, mas o resultado disso só vai ocorrer daqui a cinco, seis anos. É uma pena que isso não tenha sido feito no passado. Mas estimular o consumo sem estar preparado para o aumento da oferta resulta em mais inflação e crescimento baixo. O senhor já esteve no governo, foi ministro. Por que é tão difícil destravar o desenvolvimento? Depende muito da visão. Na área da infraestrutura, por exemplo, este governo, desde o presidente Lula, resistiu muito em fazer concessão. Achava que todo investimento deveria ser feito pelo governo. E quando começou, foi de maneira errada, de achar que se poderia fazer um certo populismo, de ter pedágio mais baixo. Isso não garante os investimentos. É necessário você fazer concessão e ter certeza de que a qualidade seja boa. Certamente para as empresas de transporte, o custo com essa situação de rodovia é maior do que se ela tivesse pagando pedágio. Sei de companhia de transporte que mantém vans para acompanhar seus caminhões, porque sabe que eles vão quebrar e precisarão de apoio.

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